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toda a vida
esperou a sua
mais que certa morte
mas quando chegou
o momento de morrer
transformou-se
numa flor
aos pobres
é vedada a morte
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senhor
livra-me desta gente
que usa a mesquinhez
como arma
e que em teu nome
escreveu um livro
que não é teu
e um filho
que foi órfão de ti
torturado e morto
e depois ressuscitado
numa estória
que não bate
certo
e não obstante
nunca conseguiu
amar o próximo
talvez porque
o próximo
fica longe demais
29
prometi
que serás
inteiramente
azul
semeei-te
falei
de ti
aos
estranhos
e
aos amigos
disse-lhes
que
sou prova
de
que tu existes
e
que contigo
tudo
é possível
até
acreditar
mas
eles
querem
mais
pois
tão difícil
é
ver o que cega
e
por isso
chamam-te
metáfora
e
mentem em teu nome
fala
com eles
poema
1
a minha casa
agora é um charco
com uma rã
e um nenúfar
dizem
que um charco
é água parada
mas é que eu viajo
nele de barco
…………
2
contra tudo
o que me dói
levanto esta mão
e desenho com ela
um sol
um risco
que atravessa
toda a folha de papel
sai mesmo dela
e vai pelo mundo
tão silencioso e profundo
é este caule
esta mão
que desenha
no coração
o mundo
2
a minha casa
está cheia de animais
mas há também
uma fotografia onde
ainda não estás
gostava de ser
como tu
que nunca vences
nem perdes
e que mesmo quando
junto as mãos
ou me inclino
é sempre tudo
tão incompleto
a minha viagem
nunca se parece
com a tua
porque tu
não começas
nem vais nem chegas
estás aqui e ali
como se estivesses
sempre em toda a parte
só não estás
na minha fotografia