todo o amor fosse
uma maneira de saber
de chegar a um lugar
qualquer
e daí partir
sem nunca chegar
e fosse ainda
uma coisa de se ver
como as laranjas
os pássaros os gatos
ser tudo
e nunca ser demais
o
poeta não busca posteridade. ele aprendeu que essa é uma palavra sem fundo
o
poeta não busca prestígio. ele sabe que tal palavra pesa muito e cega
o
poeta não escreve para que um leitor o leia. poucos serão os que, realmente,
hão de lê-lo
o
poeta não tem motivos úteis para escrever. ele desconhece por que escreve
o
poeta não escreve para que outros se sintam alegres ou tristes. ele revela
o
poeta não apregoa verdades. ele torna-se a sua verdade
o
poeta sabe que nenhum poema é escrito com palavras
o
poeta nunca há de estar onde o procuram
o
poeta não morre uma vez. morre as vezes necessárias
o
poeta escreve contigo. embora ainda não saibas, tu és Deus
como plantares uma árvore
sem borda d’água
e sem ajuda de metáforas
plantas
primeiro
um céu com
nuvens
providencia que
chova
um rio ou dois
e depois junta-lhe
um azul com muito
sol
pássaros
muitos pássaros
bichos insectos
e terra sem
chão
pois as árvores
gostam
de voar
de seguida
aguarda
a árvore começa
a crescer por
cima
ó mestre das
abelhas
conhecedor das
feridas
que as duas
mãos trazem
feitor das
plantas aromáticas
e das cores e
outros
tons subtis
que ontem
desceste da
macieira
a cantar de
pássaro
e voas que não
voas
onde nada se
move
é de ti que
falo
aos meus amigos
para que te
vejam
para que te
ouçam
para que te
sigam
em silêncio
188
já perto do fim
acabou tudo
não chegámos
a ver todo o filme
a sala estava cheia
o êxito era grande
e obrigatório
gente de todo o
lado veio assistir
nós ficámos na plateia
mas havia os do balcão
e dos camarotes
o filme estava
sempre a tropeçar
e alguém o reiniciava
para as longas e
distantes filas
já perto do final
é quando acabou
não chegámos a
entendê-lo